quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Descobri o café

Foto: Kimmy Simões*

Estou, agora mesmo, sentada em uma mesinha de madeira, ao lado de um pilão de moer grãos, no espaço mais aconchegante que encontrei neste estabelecimento curioso que chamam de “café”. É quarta-feira, meio de semana e já o segundo dia em que me recolho aqui, acolhida por este cantinho, com o caderno de cultura do jornal do dia aberto sobre a mesa. A capa apresenta os últimos lançamentos literários, os filmes em cartaz no cinema, a estreia de uma peça sobre a vida de Clarice Lispector, com a atriz Beth Goulart, entre títulos de crônicas e resenhas que preenchem as páginas adiante. Nada muito sedutor, não fosse por esse cheiro vindo do balcão, pelas pessoas passando lá fora, pelos murmurinhos do casal de idosos na mesa ao lado. Não fosse pelo fim de tarde e pela sensação de “dolce far niente” que me dá a essa hora. Não fosse pelo café.
Ah! O café... Cada um que adentra nesse universo extraordinário, um refúgio do caos lá fora, dá partida em um processo peculiar: a Hora do Café. Alguns são mais familiarizados com a coisa, os veteranos. Geralmente senhoras esbeltas de cabelo curto grisalho, batom avermelhado e óculos à la professora de francês, jovens adultos magricelas com camisa de botão entreaberta e óculos à la Woody Allen ou, na maioria das vezes, velhinhos solitários, calçando sandálias de dedo, com os óculos estrategicamente posicionados na ponta do nariz, os olhinhos miúdos percorrendo as páginas do jornal. E como para todo caso deve haver uma exceção (ou algumas exceções), cá estou eu, assumidamente seduzida pelo Ritual do Café, aos 19 anos. Eu, que até sair do Ensino Médio franzia a testa quando me ofereciam aquela bebida preta, amarga. Não que tenha sido há muito tempo, mas me pego, vez ou outra, imaginando quando fui “iniciada”. Daí lembro das madrugadas em claro, entre tratados políticos e ‘twittadas’, durante o primeiro ano de faculdade. Das cochiladas nos ônibus no trajeto entre um curso e outro. Lembro da falta de tempo, da falta de casa e de gente íntima por perto, enquanto durou a obsessão de caloura por excelência acadêmica.  Foi aí que descobri o café. Era o momento perfeito: um dia corrido chegando ao fim, a noite trazendo a segunda parte da jornada diária e, no meio,  a promessa de energias renovadas, a pausa de tudo que havia dentro de mim para dar espaço à contemplação de tudo que continuava lá fora.
Bons frequentadores de “cafés” são, portanto, ótimos observadores. Quando ali entramos nos tornamos artistas e, aproveitando o ócio criativo, somos filósofos, escritores, sociólogos... Psicólogos (por que não?!), já que passamos a identificar os “tipos” que por ali passam. Dos que estão ali só pelos quitutes, aos apressadinhos que chegam de paletó – “Sai um cafezinho rapidinho?”. Esses sentam no balcão – quando sentam –, soltam uma piadinha sem graça e tomam o líquido sagrado de um gole só. Uma verdadeira afronta, em minha opinião, aos demais ali presentes, verdadeiramente interessados, suponho, em apreciar todo o processo. Quem quiser entrar para o Clube, já sabe: vá sem pressa. Permita-se desfrutar desse tempo, seja acompanhado de um amor, de amigos ou de um bom livro. Mas vá de coração aberto, pronto para distrair-se e encantar-se com tudo ou com qualquer coisa. Quem sabe a gente não se encontre, qualquer dia, em um café por aí. “Lá está! Mais um que descobriu o café...”, eu estaria pensando, enquanto espiasse você decidir, com olhar contemplativo, entre Mocca e Cappuccino. 

*Kimmy é estudante de Rádio e Tv pela Ufpb e fotógrafa nas horas vagas. Obrigada por colaborar com a crônica de hoje :)

Um comentário:

  1. De fato o ritual do café é inigualável. Passo minhas tardes esperando pelo "café" das 5, e por sinal, a hora é 'ahora'.

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